Tradutor da SBB por 25 anos, Werner Kaschel foi um dos grandes responsáveis por fazer com que as Escrituras Sagradas ficassem mais próximas dos brasileiros.
Do alto de seus 85 anos de idade, comemorados em 4 de abril último, o reverendo batista Werner Kaschel carrega em sua biografia o compromisso com a difusão da Bíblia entre os brasileiros. Ele foi um dos grandes expoentes no trabalho de tradução
das Escrituras para uma linguagem mais próxima da falada hoje pela população brasileira. “A Palavra de Deus deve ser compreendida por todos. E isso inclui
ricos, pobres, cultos e incultos”, defende o tradutor.
Nascido em Campinas (SP), Kaschel recordase com saudades das mais de duas décadas em que trabalhou como tradutor e revisor bíblico na Sociedade Bíblica do Brasil (SBB). Ele fez parte da Comissão de Tradução da entidade, que foi responsável pela elaboração da Bíblia na Linguagem de Hoje, lançada em 1988. Participou, inclusive, de sua última revisão,finalizada no ano 2000, quando foi rebatizada de Nova Tradução na Linguagem de Hoje (NTLH).
Doutor em Teologia e especialista em Hebraico, ele traduziu todos os livros do Antigo
Testamento. Sua trajetória, calcada na divulgação do Livro Sagrado, teve início já na mais tenra idade. Aos oito anos, descobriu a vocação de pregador evangelista.
Aos 21, ingressou no ministério da Igreja Batista. Dali em diante, tornou-se um estudioso da Bíblia.
Na área acadêmica, se destacou como professor de Hebraico e Geografia Bíblica. De 1972 a 1988,foi diretor da Faculdade de Teologia do Colégio Batista Brasileiro. Werner Kaschel só parou de trabalhar em 2007, com mais de 80 anos, para cuidar de
sua saúde.
Na entrevista, a seguir, o tradutor relembra alguns momentos marcantes de sua trajetória a serviço do Livro Sagrado.
Revista ABNB: Qual a importância da tradução da Bíblia na Linguagem de Hoje?
Werner Kaschel: Ela é uma tradução fundamental.
Sempre fui amante da linguagem simples. Como pastor, eu pregava na linguagem do povo. E sabia me expressar bem por causa de um curso que fiz de homilética,
a arte de pregar. Percebia que era necessária uma tradução na linguagem simples. Muitas pessoas, até hoje, têm deficiência de ordem cultural. Por isso, traduzindo
na linguagem que o povo entende fica mais fácil compreender a Bíblia.
ABNB: Quais técnicas o senhor usava para aproximar o texto bíblico da linguagem popular?
W.K.: Para traduzir o texto bíblico em linguagem simples, tínhamos de nos colocar no lugar de uma pessoa simples e não culta. Voltamos a utilizar, por exemplo, a
expressão “Palavra” referindo a Jesus (João 1). O mais comum era “Verbo”, já que o termo “palavra” não se usava antes porque era feminino. Colocamos também no texto bíblico a palavra “amor” para substituir “caridade”.
Outra mudança se deu em Gênesis (1.2), numa passagem sem tanto sentido: “E a terra era sem forma e vazia”. Traduzimos esse trecho para “A terra era um vazio, sem nenhum ser vivente, e estava coberta por um mar profundo”. Ao revisar a tradução bíblica, é preciso levar em conta que a Palavra de Deus deve ser simples e compreendida por todos. E isso inclui ricos, pobres,cultos e incultos.
ABNB: O senhor acha que a Nova Tradução na Linguagem de Hoje (NTLH) poderá se tornar preferência nacional na leitura bíblica?
W.K.: A NTLH com certeza vai crescer na preferência dos brasileiros porque todo mundo a entende facilmente. A impressão é que muita gente gosta da Linguagem de Hoje, mas ainda existem reações contrárias a ela, pois algumas pessoas estão acostumadas com a velha tradução.
ABNB: Como foi sua chegada à SBB?
W.K.: Nos anos 80, fui morar no Rio de Janeiro para pastorear uma igreja em uma comunidade carente. Naquela época, fazia trabalhos também na Casa Publicadora Batista, na Praça da Bandeira, e a Bíblia na Linguagem de Hoje estava começando a ser
elaborada. Na época, a SBB tinha dificuldade para traduzir o Antigo Testamento para a Linguagem de Hoje em português. Certo dia, fui convidado a traduzir o livro de Jonas. Usei uma linguagem simples,do povo. Depois disso, fui convidado a colaborar
durante anos com a SBB.
ABNB: Quais lembranças o senhor tem dos trabalhos
de tradução na SBB?
W.K.: A tradução bíblica é um trabalho apaixonante. Na SBB, eu traduzi todos os livros do Antigo Testamento. O trabalho que mais me marcou, por sinal, foi a tradução
de Salmos. Mas eu também ajudava na tradução de manuais de tradução bíblicos para outros países. Meu último trabalho foi na tradução do manual de Salmos
para Angola.
ABNB: Em 2009, a SBB alcançou a marca recorde de mais de seis milhões de Bíblias distribuídas no País. Isso mostra que o brasileiro deseja ler e entender cada vez mais a Palavra de Deus?
W.K.: Com certeza! É um recorde extraordinário e isso foi alcançado em grande parte graças à facilidade de compreensão do texto sagrado, porque a pessoa pode agora ler e entender claramente toda a Bíblia.
ABNB: O senhor colaborou como tradutor bíblico na SBB até os 82 anos. O que carrega consigo dessa experiência?
W.K.: Trabalhar na SBB foi o cumprimento de um objetivo de vida. Sou muito honrado por ter participado desse empreendimento fantástico de Deus. !